Sistema ferroviário Sul / Alentejo / Sines – problemas de capacidade à vista

Sistema ferroviário Sul / Alentejo / Sines – problemas de capacidade à vista

20/07/2018 0 Por Joao Cunha

A rede ferroviária a Sul e a Este do Poceirão sofreu grandes e positivas alterações nos últimos 20 anos, contrariamente ao que foi feito noutras localizações onde ou se manteve o abandono ou se fizeram renovações essencialmente cosméticas.

As obras permitiram ligar Lisboa a Faro com tração eléctrica e com velocidades na ordem dos 200 km/h entre Pinhal Novo e Torre Vã ou ainda Lisboa a Évora com o mesmo patamar de velocidades garantido entre Pinhal Novo e Poceirão e de seguida de Vendas Novas a Évora.

O tráfego de mercadorias tem aumentado imenso graças à dinâmica do Terminal XXI em Sines, responsável já hoje por uma dezena de circulações diárias por sentido, várias delas com cerca de 700m de comprimento e 2200 toneladas de massa. Além destes, mantêm-se os 4 comboios diários de carvão por sentido (450m e 2200 toneladas de massa) a que se soma ainda uma ida e volta entre Loulé e Sines (jetfuel) e Entroncamento/Alhandra – Sines (biodiesel). O aumento no Terminal XXI é visível – há 10 anos, haviam 4 circulações por sentido e limitadas a 1000 toneladas de massa.

Entre Poceirão e Águas de Moura a circulação é feita em via dupla, o mesmo acontecendo entre Pinheiro e Grândola Norte (cerca de 30 kms, com a nova Variante de Alcácer em via única e a linha original também em via única e com 3 estações para cruzamentos).

Entre Poceirão e Sines (cerca de 125 kms) há assim cerca de 40 kms em via dupla e no restante trajecto apenas 5 estações estão aptas a cruzamentos de comboios com 700 metros: Pinheiro, Grândola-Norte, Grândola, Azinheira dos Barros e Ermidas-Sado (estação de bifurcação das linhas de Sines e Sul).

Na linha do Sul, onde o tráfego crescente de Sines coabita com pelo menos 10 circulações de passageiros concentradas entre as 08:00 e as 20:00, os troços de via única apresentam problemas de saturação muito sérios (Águas de Moura – Pinheiro) ou perto do seu limite (Grândola Norte – Ermidas-Sado).

É ainda relevante comentar que na linha do Sul a gestão do tráfego está automatizada mas não permite a circulação de mais do que um comboio entre estações – ou seja, independentemente de haverem ou não 2 ou mais comboios a circular no mesmo sentido, um só pode avançar de uma estação depois do anterior ter chegado à estação seguinte. Assim, existindo troços entre estações que demoram cerca de 10 minutos a percorrer, o fluxo máximo é de 6 comboios / hora apenas – e se for caso de circularem todos no mesmo sentido. Por exemplo entre Bombel e Poceirão a via única permite a circulação de 2 a 3 comboios no mesmo sentido entre estações, elevando a capacidade potencial nessa situação. Isto contribui também para o cenário de saturação visível hoje em dia.

O contexto dos artigos seguintes parte do princípio que os desenvolvimentos em curso em direção a Espanha (nova linha Évora – Elvas) e o impacto que isso trará para Sines (já existe um comboio Sines – Sevilha via Entroncamento e o natural será que este número depois suba rapidamente, em direção a Mérida, Cáceres, Madrid ou Valencia), sendo adquirido que o problema de saturação da linha do Sul está em gestação e obrigará a investimentos nos próximos anos para assegurar quer a fluída circulação nas horas de maior tráfego como a manutenção de uma folga de capacidade essencial para garantir flexibilidade na operação dos comboios de mercadorias.

As comparações a fazer na resolução do problema têm de ser sistemáticas e abrangentes, em vez de olhar apenas troço a troço, como é feito atualmente nos planos governamentais. Assim, as duas comparações a fazer são:

  • Acesso a Sines: opção por nova linha Grândola Norte – Sines ou intervenção na atual linha de Sines (previsto) e duplicação de via entre Ermidas-Sado e Grândola Norte
  • Efeito da ligação a Espanha no corredor Évora – Sines: opção por duplicar Pinheiro – Águas de Moura e Bombel – Poceirão ou renovação e eletrificação da linha Beja – Ourique (dando por adquirida a renovação e eletrificação de Casa Branca – Beja, justificada por outros objetivos e em acesa discussão pública)

Aproveito ainda para discutir o potencial do regresso do transporte de passageiros a Sines tendo em conta as intervenções previstas ou a comparar, tendo em conta a crescente relevância sócio-económica de Sines e Santiago do Cacém, bem visível no tráfego rodoviário.

Todos os valores de investimento estimados são-no com base nos preços unitários médios constantes de relatórios da Infraestruturas de Portugal, nomeadamente do estudo sobre o futuro da linha do Douro, de 2016.

A endereçar os problemas de capacidade no sistema Sul/Alentejo/Sines existe apenas a promessa de renovação da linha de Sines, por cerca de 115 milhões de Euros e cujo potencial de absorção do crescimento previsível é discutido nos artigos abaixo. Defendo que a sua resolução deve ser feita olhando para o sistema de linhas e ligações em causa, procurando soluções que possam resolver de forma eficaz as restrições maiores (capacidade e produtividade dos comboios) maximizando também a utilidade para outros segmentos de tráfego numa lógica de limitação do investimento ou de acréscimos de investimento de utilidade marginal crescente.

O acesso a Sines
O potencial regresso dos passageiros a Sines
Os problemas de capacidade das linhas do Sul e Alentejo
Conclusões e recomendações