PNS, o ex-ministro do futuro

PNS, o ex-ministro do futuro

29 Dezembro, 2022 0 Por Joao Cunha

É fácil bater em pessoas quando se estampam. Não é disso que trata esta crónica – a oportunidade de combater a liderança de Pedro Nuno Santos do ministério das infraestruturas existiu enquanto foi ministro.

Quando penso nos últimos quatro anos, acho que Pedro Nuno Santos acabou por acreditar sempre mais na máquina do que nele próprio – elogio ou crítica? Não sei.

É para mim indiscutível que Pedro Nuno Santos quer fazer bem ao país – como aliás acho que é o caso de praticamente todos os políticos – e que contrariamente ao PS de Macau (o de Costa), acha que para se evoluir é preciso ter ideias claras para seguir em frente. No entanto, e sobretudo nos últimos dois anos, parece-me ter dado muito mais preferência por agradar a Costa e à máquina do PS (a que é suposto dominar?) do que por respeitar as próprias ideias.

A sua desgraça na TAP acaba por ser o melhor exemplo – lembramo-nos do seu cepticismo de lançar a bóia de salvação a uma empresa semi-nacionalizada e onde os accionistas privados estavam à beira de colapsar mas, empurrado por Costa, não apenas executou um desafio de terceiros como o tomou como seu (atitude valente, mas não raras vezes inocente) – salvou os accionistas privados de uma queda estrondosa e passou os últimos dois anos a dar razão ao Carlos Guimarães Pinto, com quem travou alguns dos melhores debates sobre a matéria.

No aeroporto, herdou uma decisão que não gostava e tentou mudá-la, para acabar à pressa a manter essa decisão (Montijo), para logo passar pela maior desautorização pública que me lembro a um ministro, sendo hoje claro o motivo do drama de Costa – a ideia do aeroporto de Santarém, trazida por um grupo onde pontua um ilustre ex-accionista da TAP, salvo por Costa e PNS. O ministro, de ideias convictas e discurso forte, voltou a ficar para dar a cara por algo em que manifestamente não acreditava.

Na ferrovia os primeiros dois anos foram melhores, tantas eram as coisas básicas a refazer. Valha a verdade que a selecção de Nuno Freitas para a CP e uma pequena mas importante injecção financeira foram o bálsamo que valeu a longa Primavera de romance do ministro com a comunidade ferroviária, uma espécie de lua de mel claramente longa de mais e exagerada para lá do razoável.

Na realidade, apesar de objectivamente informado sobre o tema, não apenas não conseguiu dominar a Infraestruturas de Portugal, como acabou a aceitar empossar uma administração que não escolheu e a reforçar quem protege e causa alguns dos maiores disfuncionamentos da empresa – um passivo de segurança de arrepiar, uma dedicação aos investimentos anunciados por PNS que é no mínimo duvidosa, um desrespeito total por normas e boas práticas… enfim, uma empresa que é a mais importante do sector mas que é um cancro em acelerada metastização. A tudo isto, passadas as intenções iniciais, acabámos por ter um encolher de ombros.

Na CP foram públicos os enfrentamentos com as finanças para tentar desde a reestruturação final da dívida da empresa, como para simples autorizações de compras de rodados, luzes ou pessoas. Depois do elã inicial, com uma visível recuperação e uma invejável propaganda de feitos que eram apenas obrigatórios, o pântano também está instalado – não se sabe o que contratou o Estado nos serviços públicos que contratualizou, as oficinas continuam a perder pessoas (comprometendo a aposta inicial pela ampliação das capacidades), faltam maquinistas e revisores para assegurar a oferta comercial normal, e a lista de coisas básicas que foram perdendo prioridade continua.

Creio que a sua equipa, com pontuais excepções (e as mais brilhantes, diria), acaba também por mostrar que PNS acredita mais na sua máquina do que nele próprio – acaba a demitir-se às mãos de mais uma infantilidade do secretário de Estado das Infraestruturas, que num curto percurso acumulou perplexidades. Na habitação, a diferença entre a formulação dos desejos políticos e a implementação também deixou a nu uma equipa sem grande experiência de mundo real e demasiado virada para o mundo que nasce nas juventudes partidárias. Pelo meio, aceitou perder uma das três secretarias de Estado que tinha para este “novo” governo. Alguma inexperiência assoma.

O meu ponto aqui não é bater no ex-ministro, mas mais em perguntar-me o que leva alguém de ideias claras, de horizontes largos e com interesse em saber mais, de se entregar a um festival de acomodação e submissão a um dos líderes mais medíocres que Portugal já teve – António Costa. Esta minha interrogação parte de um elogio mas termina como crítica. Uma não vive sem a outra.

No fundo, é esta a minha perplexidade após quatro anos. Pedro Nuno Santos podia de facto ter feito a diferença, teve essa vontade e essa sensibilidade, mas acabou por não conseguir mais do que gerar uma ligeira onda numa piscina. Não sei se isso diz mais dele, do governo em que está ou até do país em geral, mas é um sentimento muito mais sincero que tenho do que provavelmente tudo aquilo que os seus apoiantes mais directos lhe transmitem.

O que sei é que mantenho um respeito intelectual importante por PNS, sobretudo por ser clara a matriz política que defende, condição fundamental para se poderem discutir essas opções. Tive oportunidade de lhe fazer chegar directa e indirectamente (sei que leu) algumas das minhas mais relevantes e acutilantes críticas enquanto foi ministro, numa continuação do que foi a sua curiosidade em início de mandato para perceber o mundo em que estava. Alguma receptividade ao conhecimento técnico do sector é, quanto a mim, o facto mais positivo e regular do ex-ministro.

Para qualquer político será sempre importante manter-se aberto ao exterior, e sobretudo ao que não é favorável, e nunca acreditar mais no chefe do que em si próprio. O dever ao que se acredita ser o melhor para o país nunca deve ser subjugado pela fidelidade ao líder. Talvez esta seja a história destes anos de pântano de Costa.

Pedro Nuno Santos foi uma esperança no sector ferroviário. Será importante entender porque não passou disso.