Investimento na eficiência

Investimento na eficiência

27 Novembro, 2023 0 Por Joao Cunha

Nem só de novas linhas ou mais comboios se faz o futuro da rede ferroviária nacional. A eficiência das suas operações aparece cada vez mais no horizonte como crítica não por critérios financeiros (que sempre foi e sempre será), mas por simples critérios de sobrevivência prática – haverão trabalhadores para todos os postos que hoje há?

Vem isto a propósito da incapacidade da CP em reforçar o serviço ferroviário que, apesar dos comboios recuperados entre 2019 e 2021, continua a apresentar basicamente o mesmo nível de oferta do auge da crise económica, quando a procura afundou para níveis hoje impensáveis. A principal razão é a falta de pessoal, que se manifesta não apenas pela insuficiência das autorizações para recrutamento, mas também pela dificuldade em recrutar.

Em Lisboa a situação com revisores é crítica e só agora, por fim, se conseguiram formar turmas de formação com candidatos suficientes para seguir adiante. Em Guifões, a oficina está num nível de produção já quase similar a quando esteve fechada – o pessoal foi saindo, as autorizações de contratação escasseiam mas a atractividade dessas carreiras é o principal óbice.

Como se resolvem estruturalmente estas preocupações? Investindo na eficiência.

Não faz sentido operar como no passado

Em 2023, não faz já sentido fazer depender as operações de comboios de paragens muito frequentes como os suburbanos da existência a bordo de revisores. O papel dos revisores é fundamentalmente de segurança e de apoio ao cliente. Ora o segundo, em comboios que param a cada três minutos, traz pouco valor e não é certamente relevante para as preferências modais dos passageiros.

Caso o investimento fosse feito na protecção das estações (controlo de bilhetes à entrada) e com câmaras e televisores para os maquinistas poderem acompanhar a entrada e saída de passageiros mesmo em estações em curva, e sabendo que as linhas suburbanas têm todas sistemas de controlo de velocidade e comunicações integradas, podia e devia ser dispensada esta função a bordo. O número de revisores desaparecia da equação na hora de pensar em reforços de oferta, com a vantagem de logo no imediato se poder realocar revisores a serviços de apoio ao cliente nas estações (onde fazem mesmo falta – as nossas estações são um deserto de apoio ao passageiro) e até para promoções a maquinistas, permitindo por isso reforçar ainda mais o serviço.

Oficinas do século XXI

Um outro foco de problemas presentes e futuros está nas oficinas, onde a CP não consegue propor carreiras suficientemente atractivas e está cada vez mais para trás. É difícil pagar os salários do sector privado sobretudo por uma razão – porque a CP não tem oficinas equipadas como muitas das oficinas do sector privado (e não falo só de transportes).

Num mundo onde pela Europa se multiplicam oficinas com capacidades de robótica (no tratamento de chaparia, mas também para fazer passear os veículos pelas estações de trabalho, sem intervenção humana) e onde se traz cada vez mais equipamento avançado para ajudar no manuseamento e reparação de componentes, a falta de investimento existente nas oficinas da CP provoca que os modelos das respectivas operações continuem estagnados, necessitando de tanto pessoal como sempre precisaram. E sem ganhos de eficiência, não há salários mais elevados – e é este fundamentalmente o problema de atracção.

O crescimento perpétuo é função da evolução tecnológica

Uma das máximas da economia é que o crescimento se consegue sobretudo por evolução tecnológica, aumentando produtividade do que é conhecido e abrindo horizontes novos até então desconhecidos.

Com a automação em grande força e o meio ferroviário tão especialmente apto a isso, é bastante confrangedor ver tão pouca acção e motivação para fazer diferente – investir dinheiro à séria em projectos sérios de aumento de produtividade e transformação tecnológica.

Sem eles, a CP e outras empresas não baixarão a necessidade de recursos humanos, o que num país em Inverno demográfico não é só uma questão de economia, é sobretudo uma questão de sobrevivência – terei capital humano para trabalhar daqui a 20 anos ou terei de minguar as operações?

Além disso, não haverão ganhos salariais importantes sem investimento que alterem a base de cálculo dos custos operacionais.

Sem revisores nos comboios suburbanos é possível aumentar oferta e reforçar serviço nas estações, quiçá reforçar o acompanhamento a bordo dos comboios interurbanos – onde é necessário. Com oficinas muito mais automatizadas, é possível manter mais comboios, com menos pessoal, e sobretudo muito mais bem pago. E em qualquer caso, ter a continuidade de negócio muito mais protegida da crescente falta de mão de obra, um problema dos nossos tempos e que veio para ficar.

Terá dito Einstein que “Insanidade é fazer sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes”.