20 anos de fotografia
Na realidade, as primeiras fotografias ferroviárias que tirei foram feitas com máquinas descartáveis da Kodak – algumas consegui recuperar, outras estarão por álbuns de família, muito preenchidos por séries anormalmente grandes de fotografias a comboios. As estações de Austerlitz em Paris e Colónia na Alemanha creio terem sido as primeiras onde, muito miúdo, fiz esses registos. Lembro-me aí de encontrar as impressionantes locomotivas da série 18 da SNCB (iguais às CC 40100 da SNCF) ou as BB 9200 à cabeça do Sud Expresso com carruagens de Lisboa e Porto.
Mas para lá dos registos mais ou menos regulares criados a partir de então, a minha capacidade de recolha e catalogação de fotografias remonta hoje a 2004, à espera que tempo e paciência me permitam ir também catalogar o que está para trás. E por isso dei por mim a pensar – o que há em 20 anos de trainspotting?
Todo este tempo foi servido por máquinas Canon – aqui está um dos assuntos onde primeiro olho para a marca! A única excepção, recente, é a ajuda pontual que os drones DJI vão dando para conseguir alguns resultados… diferentes.
20 anos de material circulante
Cingindo-me à locomotiva titular, portanto ignorando locomotivas eventualmente em múltipla ou a reboque, é sem surpresa que as locomotivas preferidas surgem na frente – acompanhadas das 5600 que, enfim, sempre foram bastante visíveis na rede nacional.
Com 1.360 comboios diferentes, as 5600 encabeçam o ranking de séries, mas se somar 2600 e 2620 (que na minha catalogação são séries distintas), estas alcançam 1.660 comboios distintos – apesar de terem estado em serviço apenas em 11 destes 20 anos. Gosto ainda de referir o quarto lutar (ou 3º, se juntarmos as 2600) das locomotivas 1900 – 633 comboios. Ou 907 comboios se as juntarmos às irmãs 1930.
No top-25 há algumas intromissões estrangeiras – na liderança fora de portas estão as Mitsubishi 251 da Renfe, havindo ainda as BB 7200 e as BB 26000 francesas, as eslovenas 363 e 541, e ainda lugar para os “patitos” S-130 da Renfe e as Vectrons da Siemens que andam por toda a Europa. 19 das 25 séries mais observadas estão em Portugal, sem surpresa:
Olhando às fotografias onde foi possível identificar o número da unidade motora titular, o domínio das locomotivas das séries mais representadas é evidente. 15 das 25 locomotivas são das séries 2600/2620 (apenas 6 não entraram no top-25… ainda), havendo 4 locomotivas 1900, outras 4 5600 e 2 comboios pendulares. Sem surpresa, neste ranking não há espaço para entrarem unidades estrangeiras. Entre estas 25, três delas (2621, 2622 e 2629) estão fora de serviço há mais de 13 anos mas mantêm-se no topo.
Achei também interessante ver como estamos de decorações – embora em algumas séries esteja talvez a subdividir demasiado as decorações à procura de indexar aspectos particulares do aspecto dos comboios, o que prejudica um pouco a aglutinação desejada feita em 30 segundos. Penso que a descrição das decorações permite perceber o que são.
Destaque para o horroroso pantone da Renfe no top-3 (uniformidade de imagem oblige!), a grande presença da decoração Béton da SNCF, ou a aparição em forma das duas grandes decorações eslovenas – vermelha e a mais recente azul. Também a Medway aparece já a meio deste top-25.
Também podemos olhar para o assunto que apaixona os portugueses – a bitola! Sem surpresa, veículos de bitola ibérica dominam largamente.
Para observar quais os fabricantes mais representados por unidade motora titular de comboios, optei por um top-10 dado que neste campo existe uma maior agregação. Sem surpresa, Alsthom (na escrita antiga) e Alstom (sua sucessora, pós época V do modelismo) dominam largamente, dado que as suas locomotivas “nez cassés” são basicamente a minha prioridade desde sempre na altura de gastar alguns trocos e tempo para ir ver comboios passar.
20 anos de serviços
Hesitei em fazer um top de serviços, dado que há tantas tipologias distintas fora de Portugal e menos por cá, de onde é a grande parte das fotografias. Ainda assim, alguns apontamentos são possíveis.
Comboios de passageiros são os serviços mais representados – sem surpresa dado serem a grande maioria das circulações em Portugal e por estarem divididos por menos tipologias de serviço do que as mercadorias. Isso também é visível nas entradas gaulesas no top-25.
Os antigos comboios de distribuição da CP Carga, extintos há muitos anos, continuam a aparecer alto na lista – todo o histórico de CP Carga está agora indexado na Medway, pois actualizei o nome da empresa. De resto, nos comboios-bloco nacionais é fácil de ver a preponderância histórica de contentores, areia e cimento. Não deixa de ser interessante ver que os comboios PTG aparecem no top-25… reais motivos de interesse!
Tentando agrupar os vários serviços comerciais em agrupamentos de tipologia de serviço, independente de designações comerciais, obtêm-se naturalmente dados menos legíveis num top alargado. Quis criar um top-10, mas detectei algo interessante alargando a 15 – a existência de tantos comboios nocturnos e inspecção da rede. Nestes últimos, sem dúvida as memórias do tempo em que a inspecção de catenária passeava regularmente as locomotivas 2600 por todos os cantos da rede electrificada.
O longo curso de passageiros domina, cá e fora de portas, sendo interessante o domínio dos granéis no transporte de mercadorias – um passado cheio de carvão e cimento em Portugal, a que se junta uma importância relativa ainda muito grande do carvão em alguns tráfegos do centro da Europa. O futuro será dos comboios de contentores, já à beira das 1.000 circulações distintas.
20 anos de geografia
Estações, linhas e locais de captação das fotografias … afinal de contas, um dos grandes prazeres do trainspotting é obrigar a conhecer vastos territórios, revelarem-se majestosas paisagens e absorver culturas locais.
Para primeira proposta, o top-25 das origens e destinos dos comboios – sem surpresa, estações portuguesas ligadas aos tipos de comboios mais vistos surgem nos lugares cimeiros.
Interessantemente, Neves Corvo consegue o top-25 de ambos apesar de ser um nicho de tráfego. Apenas duas estações estrangeiras repetem o suficiente para entrarem no meio do domínio nacional – Trasona, perto de Avilés, a estação de expedição dos comboios de bobines. E Koper, o grande porto austro-húngaro, hoje esloveno, no mar Adriático.
Quanto às linhas que mais vezes serviram de cenário, é sem surpresa que a linha do Norte esmaga e impõe-se por números de uma ordem de grandeza totalmente distintos das outras mais de 300 linhas já visitadas. A rampa de Pajares justifica um top-5 para uma linha espanhola, a Gijon – Leon, não tivessem havido tantas peregrinações aquele santuário único dos caminhos de ferro ibéricos. França entra com duas linhas convencionais – a famosa PLM (Paris – Lyon – Marselha) e a da Maurienne (Lyon – Turim), enquanto que a Eslovénia e o seu tráfego de alta densidade consegue já colocar o grande eixo Koper – Ljubljana – Maribor – Spielfeld (- Graz) no top.
O gráfico seguinte foi a maior surpresa que apanhei ao rever os dados do catálogo destes 20 anos – 55% das fotografias foram tiradas em locais não electrificados. Admito que possam aqui haver alguns erros de catalogação, mas não esperaria que fosse superior a 30-35%, o que será sempre mesmo descontando alguns erros. Sem dúvida que a importância da linha do Douro, ramal de Neves Corvo, linha do Leste e várias outras fora de portas colocaram a tracção autónoma num lugar cimeiro inesperado.
Outra surpresa vem nas localidades onde mais fotografei. Não é surpresa que Espinho, Entroncamento ou Lisboa estejam lá bem alto. Mas não esperava a grande concentração de fotografias na metrópole de Lyon ou ver o Cartaxo tão em cima. Villamanin traz a representação da rampa de Pajares, com muitas das fotografias ali realizadas feitas a partir do quarto do hostel Golpejar, unidade hoteleira de fantástica hospitalidade e o luxo dos luxos no que a caça de comboios diz respeito.
Para não maçar mais, apenas mais uma estatística – os comboios foram fotografados com um risonho céu azul e sol com a correcta exposição? Foi o caso de dois terços dos comboios fotografados. 12% tiveram apenas direito a um céu cinzento, enquanto 12% foram fotografados a contra-luz – poucos estarão totalmente contra o Sol, mas certamente todos esses em condições não ideais. Há uma magra fatia de comboios fotografados na neve e à noite, especialidades que por razões diferentes estão mais ausentes do catálogo.
O que haverá para fotografar daqui a 20 anos?